CRÔNICA - Lélio Cesar

HOMENAGEM ÁS MÃES

Neste domingo, 10 de maio, se comemora o Dia das Mães. E vocês, parceiros e parceiras, estarão comemorando, não é mesmo? Afinal, nenhum ser humano é filho de chocadeira! Pelo menos por enquanto, né? Mesmo que a mamãe já tenha sido transferida para o andar superior, não há como esquecê-la. Mãe não morre, é eterna!
Como diz o humorista, “Mãe é uma coisa tão importante que até o pobre tem uma”. Já o árbitro de futebol, ah, este tem duas de uma só vez: a verdadeira, que fica em casa torcendo, sofrendo e orando para que o filho cumpra bem o seu trabalho em campo; e a outra, aquela que, involuntariamente, entra em campo junto com o filho para ser xingada, execrada e “homenageada” com os piores adjetivos, desde o momento em que o filho pisa no gramado.
A comemoração do Dia das Mães é uma data móvel e se dá sempre no segundo domingo do mês de maio. A primeira comemoração se deu no dia 9 de maio de 1905, portanto, há 104 anos. A professora Anna Jarvis, abalada com a morte de sua mãe, a enfermeira que também se chamava Anna Jarvis, foi quem promoveu esta primeira comemoração homenageando-a em reunião privada realizada no segundo domingo de maio de 1907. No ano seguinte, 10 de maio de 1908, a comemoração se tornou pública, conforme consta de uma placa existente na Igreja Episcopal de Grafton, West Virginia, EUA.
A oficialização do Dia das Mães se deu em maio de 1910 e em 1914 a celebração foi incluída no calendário federal dos Estados Unidos, para ser comemorada sempre no segundo domingo do mês de maio.
No Brasil sua introdução se deu na ACM - Associação Cristã de Moços de Porto Alegre, no dia 12 de maio de 1918. Em 5 de maio de 1932 o presidente Getúlio Vargas instituiu oficialmente o “Dia das Mães” no Brasil, para ser comemorado sempre no segundo domingo do mês de maio, através do Decreto nº 21.366.

A SUBLIME MISSÃO
A grande missão da mulher na sociedade além do papel de professora, juíza, médica, advogada, arquiteta, psicóloga, decoradora, operária, política ou coisa do gênero, é ser MÃE. Esta é a sua missão mais importante e mais sublime. Se ela assume funções importantes e fundamentais na sociedade sem abdicar do papel de esposa e mãe, cresce como ser humano, é a verdadeira heroína.
A mulher no papel de mãe representa o amor em sua manifestação mais sublime, o contraponto à violência no mundo dominado pelo egoísmo. Existe imagem mais bela do que a de uma mulher grávida carregando dentro de si um novo ser, uma nova vida, ou a de uma da mãe amamentando o filho? No ato de amamentar ela dá ao filho a um só tempo, amor, segurança e alimento completo para seus primeiros anos de vida. O leite materno reúne vantagens que nenhum outro alimento oferece: vem em embalagem segura, na temperatura certa, está pronto para ser consumido a qualquer momento e não oferece perigo de contaminação. Ah, que bom seria se todas as mamães amamentassem seus filhos pelo tempo necessário!
Leon Tolstoi fez a advertência: “Mãe, sóis vós que tendes nas mãos a salvação do mundo”, e Júlio Dantas escreveu: “Pode secar-se, num coração de mulher, a seiva de todos os amores; nunca se extinguirá a do amor materno”.

HOMENAGEM
Para homenagear todas as mães, vou reproduzir neste espaço uma crônica que escrevi no dia 01 de junho de 1997, publicada no Jornal de Londrina no dia seguinte. Eu acabara de perder minha mãe, a inesquecível dona Amélia Cesar, levada para a outra dimensão em 29 de maio de 1997, dia em que se comemorava o “Corpus Christie”.

01/06/97
TEM FESTA NO ANDAR DE CIMA!
O céu está que é uma festa só! E não é festa mixuruca não!!! Não senhor! É festança para durar, festança para receber Amélia Cesar, a Dona Amélia ou Nenzinha para os íntimos.
A festa foi organizada com muitos dias de antecedência. Os preparativos começaram dia 30 do mês passado, quando Dona Amélia foi internada no hospital para extrair um divertículo no esôfago. A festa mesmo começou às 2:15 da madrugada do dia 29, quando Deus decidiu que era hora de levá-la para o andar de cima.
A preparação consumiu 30 dias. Sabem por que? Primeiro, porque o Pai queria que ela completasse 87 anos de vida, o que aconteceu dia 18 último. Depois, porque o Pai teria de nos preparar e a todos aqueles que conviviam com ela e que tanto a amavam, para a separação. E finalmente porque, na verdade, aqui no andar térreo ninguém queria que ela fosse. Deus a queria ao seu lado e nós a queríamos aqui por mais tempo. Por isso houve tempo suficiente para a preparação da festa de recepção e de sua morada. Não é assim que está escrito na Bíblia? “Na casa de meu Pai, há muitas moradas. Vou preparar-vos lugar”.

Frango com quiabo
Deus sabe muito das coisas. Por isso estou certo de que lá em cima tem uma panela grande e um bom fogo de fogão a lenha. Meu pai, “Seo” Idalino Cesar, por certo esfregou as mãos e pensou: “o céu agora vai conhecer o frango com quiabo da Nenzinha e o seu angu de fubá.”.
No dia em que nosso amigo deputado Homero Oguido morreu, mamãe estava passando pela investigação de uma possível deficiência cardíaca. Aguardávamos na sala de espera do Dr. Fernando Garcia, eu e minha irmã Ana Maria, e comentávamos a morte do amigo falando bem baixinho para ela não ouvir. Queríamos poupá-la de qualquer aborrecimento. De repente, ela levanta a cabeça e com ar de espanto pergunta: “O que, aquele japonesinho Homero Oguido morreu? Tadinho, tão moço, tão simples, tão bonzinho”. Minha irmã perguntou com ar surpreso: “Mamãe, a senhora conhecia o Homero Oguido?” Ela respondeu: “Uai, mas eu não fiz um frango com quiabo pra ele lá em casa, que ele comeu de se empanturrar?!”
Era do mesmo frango com quiabo que o Nassib Jabur, Álvaro Dias, José Richa, Geehrter, Ari Pararáio, Fred, Rubinho e tantos e tantos outros amigos conheceram, comeram e se fartaram pra nunca mais esquecer.
Papai era dentista prático e com seu trabalho conseguiu criar nove filhos. Isto em Jequitibá, uma cidadezinha deste tamanho, oh!, em Minas Gerais. Não era fácil dar de comer àquele bando. Era tanto filho que às vezes D. Amélia dava uma chinelada no que estava com o nariz escorrendo e limpava o nariz do que havia feito a arte.
Pois além de cuidar da casa e daquele bando de moleques incontroláveis, ela achava tempo para fazer deliciosos quitutes, biscoito maluco, broa de fubá e um fantástico caramelo de mel que os filhos vendiam no cinema e nos jogos de futebol, para ajudar no orçamento familiar.
Numa prateleira alta na cozinha, ela guardava farinha de trigo e de mandioca, fubá mimoso e polvilho, tudo bem acondicionado em latas. Para moldar as dentaduras que fazia com rara competência, “seo” Idalino usava gesso, também guardado em latas.
D. Amélia fez uns biscoitos de polvilho, e colocou na mesa para o lanche da molecada. No exato momento em que o dente de um dos moleques voava com a dentada que ele deu no biscoito, “seo” Idalino gritava lá da cozinha:

“Nenzinha, cadê a lata de gesso que guardei na prateleira?”.

Papai era fã do cômico Ronald Golias. Quando já brigava feito leão com o câncer que o derrubou, meu irmão Délio pediu ao Golias que desse uma passadinha lá em casa antes do show que faria na Exposição, para proporcionar uma alegria ao velho. Golias, sem qualquer estrelismo, topou na hora. Foi uma grande alegria para papai. Os dois deram boas gargalhadas juntos, mas quem deu a nota foi D. Amélia quando falou:

“Então você é o Golias, essa bustiquinha de gente? Na televisão parece tão grandão!!!”.
D. Amélia era muito simples. Simplória, até. Alias, essa era sua característica marcante. Certa vez, jovem ainda, disse para ela na beira do fogão: “Mãe, tomei uma decisão e escolhi minha profissão. Eu vou ser economista”, ao que ela respondeu: “Credo meu filho, e isto não é perigoso? Comunista não são aqueles homens que comem criancinhas?”.

As despedidas
Na véspera de seu internamento D. Amélia chamou a manicure que periodicamente ia à sua casa fazer suas unhas e disse: “Hoje você capricha, porque pode ser a última vez que você faz minhas unhas. Vou operar amanhã e acho que desta eu não escapo”.
No dia do internamento fez diversas ligações telefônicas. Para a moça que trabalhou algum tempo como empregada doméstica, disse: “estou telefonando para me despedir. Vou operar amanhã. Aproveite para falar comigo porque vai ser a última vez”. Ligou para os três filhos mais velhos que moram em São Paulo e também se despediu. E ainda ligou para alguns parentes distantes e outros amigos daqui mesmo. Ao seu modo, despediu-se de todos. Com a filha Ana Maria, escolheu o vestido para ser enterrada e recomendou: “não deixe que me enterrem sem dentadura”.
Assim era Amélia Cesar. Diante do caixão, falou a moça que trabalhou com ela: “De quanta gente em vi essa mulher matar a fome”. Dona Inez, 92 anos, Dona Joana, 90 anos, eram as companheiras das caminhadas matinais diárias e dos cultos na igreja. Não puderam ir à igreja, foram direto para o cemitério. A família havia decidido não mais abrir o caixão, mas o apelo delas foi mais forte. Dona Joana, que acabara de sair do hospital onde estava internada, fez o apelo com os olhos marejados: “Precisa abrir, nós queremos ver nossa amiga pela última vez, nós precisamos nos despedir”. O caixão foi aberto.

A homenagem
Se estão me achando cabotino por falar de mamãe, peço desculpas, mas a homenagem é justa. A sua existência atesta isto. O sentimento uniforme de dor demonstrado por filhos, genros, noras, netos e bisnetos - na verdade, todos filhos - provam a unanimidade do reconhecimento. Ela teve amor, carinho e afeto e soube distribuir muito bem. Deus sabia disto e lhe concedeu a divina graça de jamais ter perdido um: são 9 filhos, 9 genros e noras, 27 netos e 26 bisnetos, todos vivos, todos amando-a muito.
A última palavra é de agradecimento. Aos médicos e enfermeiros que cuidaram dela com dedicação. Aos parentes e amigos, pelas visitas solidárias, pelas mensagens carregadas de calor humano, pelo abraço fraterno, pelas palavras de consolo, pelo carinho confortante.
Nós estamos tristes sim, aqui no térreo. Mas no andar de cima, o céu se engalanou, assumiu a sua maior beleza, as trombetas soaram com vigor, anjos e arcanjos se perfilaram e as portas se abriram para receber D. Amélia, uma grande mãe, a amiga leal, a fiel companheira, a mulher de verdade.
Deus foi generoso nos dando dona Amélia como mãe. Obrigado pela sua vida.

Feliz "Dia das Mães" para todas as mamães.